sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Recordar é Viver

" Amigos podem, com sua palavra e companhia, despertar ilusões e desejos de conhecer toda a magia do mundo."

Eles já vinham nos convidando, há tempos, para uma ida a São Roque e, no último encontro ficamos combinados que, no Carnaval, iríamos para o sítio que eles possuem próximo à São Paulo.

Já que convidaram, lá vamos nós... E vamos “de galera”. Uns vão de carro e, nós , de ônibus. Com direito à baldeação em Sorocaba. A rodoviária de BH estava simplesmente intolerável. Milhares de pobres brasileiros à beira de um ataque de nervos, indóceis, a espera dos ônibus que, definitivamente, não conseguiam vencer os engarrafamentos, já que todos queriam viajar ao mesmo tempo para aproveitar o feriadão de Carnaval. As plataformas de embarque apinhadas de gente. Sentados nas bagagens, homens (será?) se massageando sensualmente, mulheres gordas querendo matar os fiscais e embarcando na “marra”, pessoas estacionando enormes malas sobre os nossos pés, sem contar os inúmeros carnavalescos completamente alcoolizados que infernizavam a vida de todo mundo. O stress tomou conta de passageiros, fiscais e motoristas diante do caos instalado. Os ônibus saindo com duas, três horas de atraso. Terminada a maratona da rodoviária, a viagem seguiu normalmente, apesar da estrada bastante movimentada.

Próximo ao Anhembi o trânsito “engessou” de vez. Para nossa alegria e regozijo de alguns passageiros, as Escolas de Samba do Primeiro Grupo estavam acabando de desfilar e centenas de integrantes da Nenê de Vila Matilde se acotovelavam nos ônibus para voltar à periferia. Baianas, piratas, descobridores, príncipes e navegantes, índios, fantasmas e passistas seminuas davam o ar da graça, apesar de visivelmente cansados. O sol forte e o trânsito lento foram minando a nossa paciência, que nessas alturas já era escassa. Mais à frente, centenas de carros desciam para o litoral entupindo a estrada e aumentando a morosidade da viagem. Só por volta das nove horas chegamos a Sorocaba, onde embarcamos para São Roque.

O dono da casa foi nos buscar e logo, logo chegamos ao paraíso. A casa é ampla é decorada com o bom gosto característico da nossa anfitriã. Plantada entre extensos gramados, bem cuidados jardins e um pequeno bosque. A velha e florida quaresmeira se enfeitou de rosa para brindar a nossa chegada. Lá embaixo o azul da piscina em meio ao verde das plantas convidava para um mergulho. A área da churrasqueira, sauna e banheiros é localizada em um grande espaço com piso de ardósia. Mesinhas, cadeiras e simpáticos banquinhos forrados de couro convidam ao relax. Um balcão sugere a cerveja bem gelada, servida quase que imediatamente proprietário do paraiso. E é nesse espaço que anfitriões e convidados exercitam seu esporte favorito e a grande pedida da temporada é jogar conversa fora. O caseiro, antigo bar-man, nos preparou coquetéis de vinho tinto e champagne, eu fiz um macarrão seguindo uma receita da Beá, mas o carro-chefe do almoço foi mesmo o churrasco, feito com pompa e circunstância pelo chef . Desnecessário dizer que tudo isso foi acompanhado de cervejas, cervejas e mais cervejas super geladas.

Quase ao anoitecer a chuva começou a cair de mansinho. Mais tarde continuamos a conversa sentindo o aroma do orégano e queijo vindo das pizzas que assavam lentamente.

Lá pelas cinco e meia da manhã acordei e fiquei na varanda, estirada na rede curtindo o belo jardim, vendo um pica-pau, no alto de uma árvore batucando com o bico tronco endurecido.
Saímos logo após o café para o sítio de outros amigos. Uma luxuosa casa em fase final de construção numa área cercada de pinus e araucárias. Chope direto de uma chopeira dourada fez a alegria dos rapazes. O churrasqueiro contratado, especialista em carnes, nos deixou encantados com a habilidade no trato com as picanhas, lingüiças, costelas e lombos. O vinho italiano, geladíssimo, as uvas e ameixas frescas, salada verde de verdurinhas colhidas no dia nos seguraram à mesa por várias horas. Jogamos sinuca, conhecemos a criação de cabras e a cultura hidropônica, que é o chamego do dono que, aposentado, pode curtir esses raros prazeres. Só após outra rodada de pôquer, mais chope, charutos, golinhos de grappa, licores fantásticos, café expresso acompanhado da enorme simpatia dos nossos novos amigos, é que conseguimos, finalmente, tomar o rumo da Rodovia Raposo Tavares. Após nos perdermos e nos acharmos, chegamos ao sítio. Entre bêbados e perdidos acabamos encontrando o caminho ...

Logo na chegada uma das “meninas” protagonizou uma cena de “aracnofobia” e eu demonstrei extrema coragem ao exterminar com inseticida uma monstruosa aranha que invadira os aposentos da ex donzela recém casada. Na verdade o terror só não foi maior que o pânico demonstrado pelas crianças com a aparição de um demônio vermelho soltando fogo pelas ventas. Só se acalmaram ao descobrirem que o tal capeta não era senão o dono da casa com uma máscara de látex, comemorando o carnaval e recordando bons momentos da infância.

Todos querem aproveitar as últimas horas e não se cansam de recordar os fatos do passados, a infância difícil, a escola, a convivência com os primos, os casos engraçados, a avó – pessoa que marcou a vida de todos - os namoros de antigamente...

Nosso anfitrião, para ter realmente a certeza que iríamos embora, nos levou até Sorocaba onde embarcaríamos rumo a BH.

O carnaval de 2000 foi marcado pelo carinho com que fomos recebidos, as conversas ao pé da lareira, os banhos de piscinas, o churrasco, as boas risadas e os inesquecíveis momentos que passamos junto àqueles que queremos tão bem.

Esse post vai para o Kiko, agora em terras africanas e para a Beá que está em Sampa - amigos de fé. E para a Zélia, onde quer que ela esteja.

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